sexta-feira, março 23, 2007

Crónicas da Galinha Riça - A Linhagem

A linhagem está em perigo. Uma das galinhas-mor que, contrariando tendências, usurpa de poleiro considerável, foi, alegadamente, alvo de uma bicada insidiosa por parte de um correligionário atrevido. No calor da disputa pelo poleiro, à galinha Maria José de nada lhe valeu o apelido Pinto. O agressor não se deixou comover por referências infantis e arrancou-lhe umas quantas penas, tal foi a violência do confronto. E logo das mais lustrosas. As da dignidade.
Parece ter havido tamanha escaramuça naquele galinheiro que muitos dos galináceos residentes, independentemente dos privilégios que dispõem, ameaçam abandonar o prostíbulo. Embora poucos, ou talvez por isso, demonstram um forte sentido de competição por posições altaneiras na capoeira, até agora liderada por um galo de fraca competência, facto que abriu “portas” a outros voos rapineiros.
Esta herança competitiva ficou-lhes do nacionalismo expansionista aquando da domesticação do território, bandeira de que ainda hoje se orgulham e da qual julgam ser os verdadeiros herdeiros. Saudosos de questiúnculas monárquicas a propósito de direitos sucessórios ao trono, bastou o galo Portas, que alguns apelidam de “raposa”, voltar a abanar a cauda e desatou tudo a espavonear-se desenfreadamente, reformulando posições e alianças internas no intuito de melhor se servirem da gamela.
Veio em sua defesa, o suposto agressor, declarar que tudo não passou de uma questão de colorido. As suas penas não eram da mesma cor que as da ofendida e daí a razão da escaramuça - se eu não tivesse estas penas nada disto tinha acontecido – declarou, expondo o seu penar. Logo se gerou uma confusão de argumentos e insinuações que descambaram numa trapalhada com contornos racistas.
A linhagem desta família assegura aos seus membros um colorido generoso e as múltiplas colorações que detêm são comummente objecto de disputas preferenciais. Ou não fosse este galinheiro de direita, reduto de algumas tradições aristocratas pouco recomendáveis. Ora, segundo a linha que eles próprios advogam, as variantes cromáticas podem perfeitamente favorecer a natureza de determinado exemplar, em detrimento de outros cuja penugem se evidencie menos brilhante. Então se for monocromática e em tons pouco comuns ao género, o exemplar certamente não corresponde à linha genética desta família, circunstância que por certo pesou no desaguisado.
O que não entendo é a presença permitida daquele exemplar duvidoso no seio daquela família. Então tantos anos de afinação genealógica de tão dignos membros não foram suficientes para acautelar misturas inconvenientes? Andou o Mouzinho de Albuquerque na sua campanha por terras de África, a apurar a espécie livrando-os de gungunhanas e outros bijagós, para agora serem aviltados por infiltrações de elementos de ascendência suspeita e outros que, embora de casta aceitável, revelam comportamentos injustificáveis. Ele é o raposa Portas, habilidoso palaciano; ele é um tal galaró Monteiro, doninha destemperada; e agora, para cúmulo, um servo, aio da raposa, acaba por comprometer seriamente a linhagem familiar e corromper irreversivelmente a estirpe. Hilariante.
Quanto a este elemento destabilizador parece que houve negligência grosseira aquando da apreciação do seu processo de admissão. Foi-lhe concedido o benefício da dúvida por ter alegado que um seu antepassado pertenceu ao bando de saqueadores liderado por Viriato, estatuto que, após o Estado Novo ter reescrito a história e atribuído a Viriato honras de general, lhe conferiu de imediato acesso a posição privilegiada. Tal suposição carece de confirmação, mas desde já indicia falhas graves de recrutamento que, a bem do grupo familiar, convém corrigir.
Ainda assim, folgo saber que a galinha-mor optou pelo silêncio, resguardando-se da vergonha que a contenda prometia. No entanto, pondera renegar a família, gesto assaz curioso para quem, como ela, sabe que o suposto agressor sabe aquilo que ela sabe que ele sabe.

Bons repenicos

7 comentários:

Achadiça disse...

Parece que ninguém quer meter o bedelho neste galinheiro que tu glosaste. Porque será?

Cingab disse...

@Achadiça,
Eu venho por aqui!... Só não comento por ser muito à frente... Um gajo limitado como eu não consegue comentar nada!

Achadiça disse...

Então Cingab, onde foi buscar agora essa limitação... tirando o jeito para as quadras a sua participação é sempre interessante.
Não lhe ocorre dizer nada a propósito desta família... nem do descendente do Viriato, segundo a Riça um saqueador (o Viriato, não o descendente). Bem, quem sabe se também não lhe ficou o jeito (ao descendente, não a si, bem entendido).
O menino (permita-me o trato carinhoso) já o referiu numa das suas bicadas, noutro contexto mas igualmente acintoso.
Bique sempre, fino ou normal, bique laranja ou bique cristal. No seu caso deve ser mais laranja... vermelho é que nunca. Bem, só se for a escrever sobre futebol não é?
Boas bicadas

Tomahock disse...

os melhores comentários do Cingab neste blog costumam ser aqueles que ele diz
"lol"
Por isso aqui não é de esperar muito...

Cingab disse...

@Achadiça,
EU sou vermelho e amarelo, pelo menos naquilo que você quiz dizer com as cores!...
Quanto a este blogue ando muito à frente, passam-me coisas ao lado... Por exemplo, ainda ninguém me explicou aquela coisa do Delfim

@Tomahock,
Sempre a puxarem por mim... lol
lol
lol

Achadiça disse...

Ó Cingab então não se apercebeu que foi a Riça que exagerou outra vez a dose do Prozac. Sei lá quem é o Delfim. Se calhar nem ela...
Boas bicadas
PS. Vermelho e amarelo não é partido é missão (lol)

Cingab disse...

Missão também não!... Mas anda lá perto!...
Não!... A Riça quando escreve tem algo em mente...