segunda-feira, abril 30, 2007

Provocação 2


- Sabes querido, quando falas fazes-me lembrar o mar...
- Ena, amor. Não sabia que te impressiono tanto.
- Não é que me impressiones. Enjoas-me.

terça-feira, abril 24, 2007

Evocativo



A data de 25 de Abril de 1974 traz-me à memória deslumbramentos de tenra idade. Por essa altura tive uma paixão platónica pelo professor de Ciências Sociais. Recordo-lhe as guedelhas de intelectual, que talvez não fosse, as calças de ganga justas e as sapatilhas brancas. Não teria mais que 26, 27 anos. Para mim as palavras capitalismo ou proletariado, pronunciadas pela boca dele, eram autênticas e apaixonantes palavras de amor.
Era da nova geração, urbano, “pra frentex”, como se diria agora, e não faço ideia como foi cair na Escola Técnica do Dão. Perante a desorganização pedagógica instalada e o novo ideário político que a revolução semeara, o prof. não se deixava apoquentar. Ao contrário dos professores mais antigos, angustiados com o “poder popular” dos alunos que, a cada reunião académica, queimavam simbolicamente todo e qualquer tipo de poder instituído, em fogueiras ateadas com palavras como reaccionário, fascista ou ditador, o meu prof. de Ciências Sociais movimentava-se descontraidamente naquele clima de excessos. Transmitia serenidade e cativava os alunos mais alvoroçados pelo calor da revolução com o seu método moderno (à altura) de lidar connosco. Tratava-nos por “tu”, ouvia-nos atentamente e respeitava as nossas opiniões, deliberava democraticamente após consultar a opinião geral, organizava actividades extracurriculares ligadas à arte e ao desporto, deixava-nos escolher temas que depois debatíamos na aula, incentivava-nos a defender os nossos pontos de vista, falava abertamente de sexo, de Deus, das religiões, do Homem, mas acima de tudo ensinava-nos a democracia e a vivê-la no respeito pelos outros.
E eu, completamente absorvida pelo homem e pelo professor, não conseguia arrumar um pensamento de cada vez que ele me dirigia a palavra. Sentia-me vítrea, no limite do pudor, receosa que ele detectasse o desejo indisfarçável. Ainda hoje me questiono se alguma vez percebeu que era ele que eu aconchegava nas minhas transgressões sexuais de adolescente despontada. Tenho quase a certeza que sim.
Um dia, data inesquecível, uma aragem vinda da serra invadiu a sala de aulas. Estão a ver as arcadas do edifício principal da escola? Era uma dessas salas, cujas janelas davam para o campo onde praticávamos ginástica, contíguo à antiga casa do pessoal da CPFE. A janela que estava próxima da minha carteira era a responsável pelo sopro de vento que se fazia sentir. Tentei-a fechar mas em vão. O ferrolho não funcionava. Diligente, o professor veio em meu auxílio, mas para chegar à janela teve que debruçar-se todo sobre mim. Ali ficámos durante segundos naquela posição embaraçosa, ele em equilíbrio periclitante, a esforçar-se para trancar a janela e eu, deliciosamente paralisada pelo conforto do toque do seu corpo, tentando controlar o desmaio eminente.
Não ousei mexer-me. O professor persistia com o ferrolho, até que este cedeu repentinamente, entalando-lhe um dedo. Não controlou a dor e deixou sair baixinho, de forma ininteligível para os restantes alunos, mas não para mim, um inconveniente “daaa-se”. Olhou-me íntimo, buscando na cumplicidade do nosso olhar a minha compreensão pelo descuido. E eu percebi naquele preciso momento que tinha acabado de partilhar o olhar dos amantes que nunca seríamos mas que, por breves momentos logrei entrever.
É por isto que o dia 25 de Abril me faz sempre lembrar o meu professor de Ciências Sociais e os meus verdes anos passados na extinta Escola Técnica do Dão.

Boas minhocas

sexta-feira, abril 20, 2007

Correspondência

Desde que este galinheiro abriu as portas ao público e os primeiros mails nos foram chegando, foi sempre com alguma expectativa que os abrimos, esperançadas que daí pudessem surgir matérias publicáveis no berloque ou conversas interessantes sobre os assuntos referenciados.
Tivemos imensas mensagens brincalhonas, umas provocantes, outras ternurentas, mas a maior parte de mau gosto. A partir de determinada altura um imbecil qualquer decidiu encher-nos a caixa de correio com pornografia. Recentemente demos conta que determinados mails estavam armadilhados com vírus e outras processos de infiltração. Eu ainda me safei mas a Cris teve que formatar o disco com os inconvenientes que isso traz. Não sei se isto é comum acontecer convosco, mas no nosso caso pensamos que tais comportamentos foram deliberados. Perdoai-lhes Senhor… aos fracos de espírito.
Embora desgostosa, porque no meio de muita porcaria apareciam coisas interessantes e pessoas engraçadas, decidi acabar com o e-mail. Aos “bem-intencionados” que nos têm enviado mensagens pedimos desculpa por não respondermos, pois com a passagem do tempo fomos descurando a consulta da caixa de e-mail. Ao pessoal de confiança oportunamente será dado conta do novo e-mail, o qual agradeço que não incluam em mensagens colectivas ou transmitam a terceiros.
Para animar a malta deixamos um dos melhores exemplares de pornografia que nos foi endereçado.
Boas bicadas, a presidente Achadiça.



quinta-feira, abril 19, 2007

Divorciados(as)

Ninguém se consegue divorciar realmente em Canas. Pode-se oficialmente adquirir esse estatuto, agora divórcio pleno, não me parece. Não será uma situação exclusiva da nossa terra pois o problema é transversal às terras de pequena dimensão, mas das outras não conheço os meandros, por isso fiquemos pela nossa.
A percentagem de divórcios vem, à semelhança dos índices nacionais, aumentando significativamente. As razões são muitas e variadas, desde a mais ténue insatisfação à extrema violência que se instala no seio familiar. Se, noutros tempos os elementos do casal se sujeitavam a uma vivência dolorosa, mantendo aparências e conveniências materiais, hoje em dia, o direito ao inconformismo impõe novas regras e precipita o casal para a separação, a bem da sanidade mental de ambos, a bem dos filhos e da dignidade pessoal de cada um.
Mudaram muitas coisas, mas o que basicamente tornou possível a quebra das regras de outrora foi a mudança de mentalidade e a autonomia financeira que as mulheres entretanto conquistaram.
A idade em que maior parte dos divórcios ocorre situa-se entre os trinta e os quarenta anos. E aqui é que as coisas se complicam para os divorciados(as) canenses. Não ignorando as dificuldades que os homens divorciados também sentem, sinto-me mais à vontade para falar delas, de nós, mulheres.
Uma mulher com cerca de 35 anos divorcia-se. Ultrapassada a fase emocional da questão pensa reorganizar a cabeça e relançar a sua vida amorosa, mas logo verifica que isso não é simples. Como a distância é pequena, o ex-marido não lhe sai da porta, ou à caça de uma sopita, ou porque quer ver o filho, ou porque teima em não levar a tralha e a cada necessidade invade a casa.
Isto aplica-se a quase todos. A casa, que ainda é dos dois, embora o usufruto seja dela e do filho, dá-lhes direitos de visitas repentinas, isto quando não vêm de mansinho matar saudades do sofá predilecto. Aparecem sem um telefonema, um aviso e sempre com fome. Às vezes fome de amor, estampada no rosto e nas mãos. E nós, eternamente maternais, condescendemos.
Menos frequentes mas de igual modo confrangedoras são as visitas dos avós paternos. A avó debita o discurso do costume, “olha o que cresceu o nosso netinho! E está cada vez mais parecido com o pai. Ó rapariga, nem imaginas como ele anda triste… ó João dá aí 20 euros p’ró menino”, o avô tira contrariado o dinheiro da carteira e continua a sondar os cantos à casa, na expectativa de encontrar rasto de macho cobridor. Sai-se de casa angustiada, a perguntarmo-nos quando cortamos definitivamente com estas visitas, mas lá fora a situação não melhora. Na rua, nos cafés, no mercado, enfim, em todo o lado, lá estão os cunhados, os amigos dele e, inevitavelmente, o próprio, o ex-marido. O puto corre para o pai e lá ficamos nós penduradas, na incerteza do gesto a adoptar: sentarmo-nos ao pé do ex-marido, como se o divórcio fosse um capricho, ou aguardarmos estupidamente de pé pelo fim dos afagos que o pai faz questão em eternizar? Preserve-se acima de tudo o rebento - Sr. Ilídio, uma bica dupla… por acaso não tem por aí o jornal? – ou então, em desespero, a desculpa esfarrapada do costume – anda, vamos embora que ainda tens que fazer os trabalhos de casa. E o puto que não, que não tem TPC. E nós à beira de um ataque de nervos.
Mas há mais. Canas é uma terra em que habitualmente os jovens casam cedo. Por volta dos vinte seis, vinte e sete anos, está tudo despachado. Os que restam ou são cromos ou algum problema devem ter, logo estão dispensados. Ora, digam-me lá para onde se vira uma divorciada com trinta e poucos anos? Pois, não se vira nem há quem a vire. Homens casados estão fora de questão, os divorciados trazem para a cama a ex-mulher, os filhos e até o cão, enfim, a nostalgia do casamento falhado; e os rapazitos novos, ainda que apetecíveis, não possuem a discrição recomendada. Mesmo assim, se porventura arranjarmos alguém concertado, sentimos logo os olhares censuráveis da populaça e o juízo crítico dos familiares, já para não falar da birra ciumenta do ex-marido. Perante isto, digam-me lá qual a solução para uma divorciada canense com trinta e poucos anos?
É por isso que amanhã vou a Lisboa ter com o meu homem da pizza. Isto se o meu ex-marido ficar com o miúdo e não ler este texto.

Boas minhocas e bom fim de semana para vocês também.

sexta-feira, abril 13, 2007

Ao meu estagiário


Fiz ontem 40 anos. Acordei com uma telha digna de viga reforçada.
Isto passar dos “inta” para os “enta” tem o seu quê. Habitua-te, pensei eu. Senti uma sensação de inconformismo atávico e a plena convicção de que o espelho começava a trair-me. O raio do espelho não me era fiel. Hoje reflectia alguém que não era eu.
Desci as escadas indisposta e dirigi-me à cozinha onde o meu marido e os miúdos já tomavam o pequeno-almoço.
Fiquei na expectativa que me saudassem efusivamente: “feliz aniversário querida”, “feliz aniversário mãe”. Para meu assombro ninguém se pronunciou. Só os bons-dias do costume e uma vaga alusão à gata que não deixa ninguém dormir por causa do cio.
Fui para o trabalho verdadeiramente desapontada. Já não bastava a angústia da “quarentona”, ainda por cima a indiferença do marido.
Cheguei à escola. Sou mais uma daquelas vítimas preferenciais das grandes opções do governo para diminuir o défice. Funcionária pública, professora do secundário, acedi ser orientadora de estágio para ver se colmatava, com os míseros 80€ que tal função remunera, a galopante subida da taxa de juro do crédito à habitação; já para não falar do congelamento da progressão na carreira e a estagnação do vencimento base que, em três anos, foi alvo de um aumento de 1,5%.
Tenho um estagiário simpático e inteligente. Depois de várias atribulações profissionais decidiu seguir a via do ensino e acabou colocado na minha escola, sobre a batuta cá da menina. Fui encontrá-lo sorridente junto à máquina do café.
- Bom dia e feliz aniversário – cumprimentou-me afectuoso.
Finalmente alguém se lembrou dos meus anos! Ainda que o facto não me trouxesse grande alegria a expressão dele conseguiu animar-me e a má disposição desvaneceu-se ligeiramente.
Tinha acabado o último tempo da manhã quando o estagiário se me dirigiu delicadamente anunciando um surpreendente convite para almoçar, “só a C. e eu”, sussurrou ele.
Embora ele me trate com deferência considero-o praticamente como um colega de trabalho. Tanto assim que, desde o início, fiz questão que me tratasse pelo meu nome, sem títulos nem salamaleques. Achei a observação “só a C. e eu” um pouco despropositada, mas esta malta nova tem códigos próprios e desvalorizei a impressão. Fomos a um lugar bastante reservado escolhido por ele. Para afastar a sensação de desconforto que ainda pairava sobre mim desde que tomei consciência da minha "nova" idade, bebi vinho. Divertimo-nos muito e, no caminho de volta, ele sugeriu:
- E se fossemos a minha casa? É mesmo aqui. Tenho um projecto sobre os currículos pedagógicos e gostava de ouvir a sua opinião.
Fosse pelo vinho ou por não ter nada de mais interessante para fazer, acedi. Enquanto saboreava um Porto e avaliava o trabalho ao computador, ele disse:
- Se não se importa, vou até o meu quarto vestir uma roupa mais confortável.
Pronunciou a frase com um sorriso terno e sedutor, reforçando com o olhar a sugestão atrevida que, pensava eu, lhe tinha escrutinado na intenção.
Pasmei. Passou-me um turbilhão de coisas pela cabeça. Mas a verdade é que me cresceu um ímpeto físico incontrolável, ao qual as palavras deram, inconscientemente, aprovação.
- Tudo bem. Fica à vontade - concedi cúmplice.
Arrependi-me imediatamente. As implicações no trabalho seriam negativas e o meu comportamento reprovável, quer à luz da minha consciência moral e profissional, quer no respeito que o meu marido e os meus filhos merecem. Por outro lado, a possibilidade de nos enrolarmos esgotar-se-ia aqui, nesta sala. O ano lectivo está a acabar, nunca mais o vejo e o corpo urge. Que raio, como o corpo urge! Isto devem ser ânsias da nova idade, gracejei interiormente.
Quarenta anos, um sofá e um estagiário! Busquei explicação que servisse de pilar a esta vontade censurável: estás fragilizada com esta coisa da idade e encontraste neste jovem sedutor a salvação para o envelhecimento. Afinal ainda és desejada. Este rapaz devolve-te o reflexo da vaidade que o espelho te nega, não é? Pois, pois…
Que se lixe. É a bem do ego, convenci-me, ainda que ciente de quão o corpo engana a mente. Conferi mentalmente o estado da depilação, a decência da roupa interior e ajeitei-me.
Decorridos mais ou menos cinco minutos, ele saiu do quarto. Carregava um bolo enorme. Atrás, vinha o meu marido seguido pelos meus filhos, amigos e alguns colegas da escola. Entoavam entusiásticos “ Parabéns a você…!!!”
E eu... lá estava, sentada no sofá da sala, em cuecas e sutiã, aguardando a minha iniciação de quarentona.
Nunca me hei-de esquecer. Estagiário, mesmo simpático e inteligente, só faz merda!

Boas minhocas

segunda-feira, abril 09, 2007

Crónicas da Galinha Riça - O Silêncio dos Inocentes

Impera um silêncio generalizado por estas bandas. Eu, por hábito e rigor profissionais, preciso de factos devidamente comprovados para exercer o mister que assumi aqui no Mulherio. No entanto, ultimamente, só algum juízo especulativo torna possível manter estas crónicas.
O pacto de silêncio entre a “presidente de lá” e o “presidente de cá” a que serenamente vamos assistindo foi tacitamente acordado depois de salvaguardadas duas cláusulas fundamentais na relação entre ambos e que basicamente determinam: eu vou fazendo, tu calas.
Não pensem que a assinatura deste pacto foi pacífica. O nosso presidente, intrépido como ele é, não é homem para ficar calado, muito menos a rogo de mulher. Reconhecendo que este acordo, baseado no silêncio e condicionado pela expressão vaga constante no documento “eu vou fazendo” não vinculava a presidente a qualquer compromisso tangível, exigiu que lhe fossem dadas garantias de que efectivamente o seu silêncio teria como contrapartida obra feita e da grande. Nada de passeios, rotundas, lâmpadas ou alcatrão. Queria algo que calasse não unicamente a sua pessoa mas que embasbacasse definitivamente os canenses. Era este o preço do silêncio.
Os preâmbulos do acordo foram diligenciados pelo gabinete jurídico da presidente que, susceptível à exigência do autarca, solicitou que este elaborasse um memorando com os grandes objectivos que ele tinha em mente para a sua freguesia. Seriam devidamente avaliados e por certo alcançar-se-ia um acordo favorável para ambas as partes.
Não levantou grande dificuldade enumerar as grandes obras e os projectos que o presidente ambicionava para Canas. A saber:
- Uma central de biomassa (em alternativa uma central atómica).
- O aeroporto, previsto para a OTA, a implementar entre Canas de Senhorim e a Aguieira.
- A passagem do TGV na linha da Beira-Alta.
- A realização da final da Liga dos Campeões no complexo desportivo de CS.
O nosso presidente apensou o rol de projectos ao protocolo da mudez e remeteu-o à presidente. Esta leu-o incrédula. Depois de fazer uns telefonemas a solicitar aconselhamento, ponderou a estratégia e chamou o presidente ao seu gabinete. Foi directa.
- Sr. presidente, algumas destas possibilidades estão fora de questão. É o caso da central de biomassa que já está planeada para a sede do município; o TGV, cujo traçado já está determinado e a final da Liga dos Campeões, que está fora do âmbito institucional do estado. Quanto à central nuclear, como sabe, o governo excluiu essa via do plano energético do país… portanto resta-lhe, aliás, resta-nos a construção do aeroporto que está previsto para a OTA.
O nosso presidente ficou mudo, mesmo antes de assinar o pacto de silêncio. Por esta é que ele não esperava. Tinha inscrito alguns exageros no "memo" para que, por obvia eliminação, a presidente cedesse a central de biomassa que lhe parecia bastante acessível. Agora deparava-se com a possibilidade megalómana de um aeroporto. Bem, se isto fosse avante recolhia à clausura da ordem das Carmelitas e fazia votos de silêncio para toda a vida. A voz da presidente tirou-o da estupefacção.
- Claro que será difícil demover o actual governo da intenção de o construir na OTA. Porém tive a confirmação das mais altas entidades do principal partido da oposição que envidarão todos os esforços para que a decisão sobre a localização do aeroporto seja revista. Para além disso receberam com bom grado a sugestão que aponta a sua fixação no interior beirão e prontificaram-se a enviar técnicos para iniciar os estudos preliminares... mas o que dava mesmo jeito era uma palavra de apoio do Presidente da República.
Ó que carago! Outra vez o Presidente da República. Será que hei-de ser eternamente perseguido por esta figura. Tudo se faz neste país, de bom e de mau, sem um ai do PR, mas quando nos toca a nós lá está o supra-sumo da nação de veto em riste a reclamar a cabeça dos inocentes – remoeu em pensamento o nosso presidente.
Destas reflexões não deu conta à presidente. Confiou nas suas boas intenções e, com alguma apreensão mas consciente que pouco mais poderia fazer, assinou o pacto e colocou a mordaça.
Adivinhando-lhe as preocupações a presidente serenou-o:
- Não se preocupe, este Presidente da República é cá dos nossos. Vai ver que não interfere. O importante é cumprir o tratado, portanto bico calado.
Nos últimos tempos temos assistido a grandes controversas sobre a localização do novo aeroporto, estimuladas exclusivamente por iniciativa do partido que apoia a presidente. Ainda é cedo para festejar, até porque “festejos antecipados dão sempre maus resultados”, como muito bem nós sabemos, mas agrada-me a ideia de que o mutismo do nosso presidente está a dar os seus frutos. Parece-me para breve o fim do silêncio dos inocentes. Já ouço o barulho das turbinas dos aviões lá para os lados do Paçal. Vrrruuuum. Vrrrruuummm. Ou serão as Bruxas do Paitor?

Bons repenicos

quinta-feira, abril 05, 2007

Desafio Pascal

A matemática é uma coisa fantástica, como se pode comprovar se forem bem sucedidos na resolução deste problema. Os cálculos não exigem grandes conhecimentos. Um aluno razoável a matemática que frequente o 9º ano tem obrigação de o resolver.

Eu tenho mais 21 anos que o meu filho.
Daqui a seis anos terei 5 vezes a idade dele.

Pergunta: Onde é que está o pai?

Aproveito para desejar a todos uma boa Páscoa.
Boas bicadas e bons cálculos

quarta-feira, abril 04, 2007

Interioridade

Canas sufoca. Não há serras nem aragens que lhe valham. Fechada sobre si mesma, esta vila só pode contar com os seus habitantes. Não é local privilegiado de passagem, não possui qualquer infra-estrutura cultural ou comercial que motive visitantes ou curiosos e disso se ressente a malta mais nova.
Lá vamos tendo esporadicamente uns eventos, como o Carnaval, o Canas em Movimento, a Feira Medieval, mas o dia a dia não tem soluções lúdicas ou culturais de relevo. Isto, se aos mais velhos, não traz grande preocupação, já aos mais novos, ávidos de animação e novidade, cria uma sensação de angústia e claustrofobia.
Chega o fim-de-semana e as soluções repetem-se: se estiver calor, vai-se até à piscina; se estiver frio arrastamo-nos pelos cafés. Não há alternativas, a não ser que a idade o permita e o diligente carrito do papá se faça à estrada (isto se o papá para aí estiver virado). Mas à noite! À noite é que a porca torce o rabo. Um único bar e sempre igual na frequência, nas músicas, nos vídeos, nos bêbados. Uf! Deprimente não é? O pior é que à noite o pai não cede a viatura, não vá algum maganão “afalfar” a menina e conspurcar os preciosos estofos.
Mas o pior de tudo é sobreviver ao Inverno. O clima não ajuda e a actividade mais excitante que se vislumbra é assar uma chouriça à lareira, regada com o tinto da casa. Do mal, o menos. Entretanto anseia-se pelo Verão e com ele a procissão festivaleira. Mochila às costas, corda aos sapatos que Vilar de Mouros, a Zambujeira ou outro qualquer lugar de culto, propiciam abençoadas fugas à monotonia. Aproveitar ao máximo pois outro Inverno se anuncia. Canas fica deserta, no Verão por ausência, no Inverno por recolhimento.
Chega-se por volta dos dezoito anos e se tudo correu bem os estudos clamam por outras paragens. Finalmente algum movimento. Pode ser Viseu, Coimbra, Guarda, Aveiro, Braga ou outra terra qualquer. Vai-se de muito boa vontade, fazer pela vida e pela diversão. Agora há que ter juizinho. Equilibrar muito bem o tempo dos estudos com os da borga para não se dar o caso de, logo no primeiro ano, começarem as cadeiras a acumular-se. Tem que se atinar, essa é que é essa, e quando damos conta estamos atulhados em exames, trabalhos, frequências, sem tempo para nos coçarmos, quanto mais para a folia. Ironicamente começamos a ter saudades dos tempos e da indigência da piscina e do Quebra. Olha que uma destas!
Depois, quando vamos a Canas pelo fim-de-semana ou pelas férias comentamos o facto com aqueles que por lá ficaram e damos connosco numa conversa de parvos. Eles a dizerem que nós devemos estar malucos, que aquilo lá pela cidade é que é bom, e nós a contra-argumentarmos que aqui é que se está bem. Claro que acabamos por perceber que ambas as interpretações são válidas pela diferente perspectiva que encerram. Mas não deixa de ser curioso.
O ideal era Canas desenvolver-se um pouco mais, mesmo correndo o risco de perdermos um pouco de tranquilidade. Isso traria mais população e provavelmente mais animação. Então justificar-se-iam ou pelo menos seriam economicamente viáveis investimentos lúdicos que multiplicassem as opções para a juventude e para os habitantes em geral. Estou a falar de um Cinema, de uma Discoteca, de um ou outro Bar, de mais actividades nocturnas ao fim de semana, eventos musicais, espectáculos, concertos, teatro… já estou a delirar! Mas como eu gostava de ter tudo isto na minha terra. Já agora um espaço multi-media… então é que os berloques se animavam!

Boas bicadas