sexta-feira, novembro 10, 2006

O número 254

O meu Juvenal anda preocupado. Com um número. O número 254.
Não é um número qualquer. Este número alterou muitos hábitos cá em casa. Por causa dele, do número, que é o mesmo que dizer, do meu Juvenal, ando numa roda-viva, reinventando ementas e quebrando rotinas. Menos preocupante é o número 166, diz ele, tentando obter a minha condescendência para com o digestivo pós-jantar, que ele carinhosamente apelida de “chiripiti”.
Eu bem o avisei que temporadas de sofá, pipas do Dão e tabaco a granel não lhe trariam grande futuro. Pois aí está o resultado: Colesterol - 254, triglicéridos – 166.
Anda inconsolável, «porra, não posso comer, não posso beber…», depois, olha para mim resignado, com aquele sorriso maroto que lhe ficou de criança, «pois, já agora só falta isso…», e eu, «atreve-te!». Mas arrebitou. Agora desdobra-se em intenções: Que vai andar de bicicleta, evitar gorduras, moderar o consumo de álcool (vejam o preciosismo, não é deixar de beber é moderar) e, milagre dos milagres, deixar de fumar. Mantive o ar mais sério possível, para que ele não vacilasse nos propósitos, mas lá no fundo apetecia-me desdenhar de tão boas intenções. Adivinhando o meu cepticismo foi peremptório, «a partir de amanhã não fumo mais».
Efectivamente, não fumou o dia inteiro. À noite bufava lá por casa, desassossegando-me os nervos e a paciência. «Acho que vou dar uma volta para desanuviar a ansiedade», disse-me ele, acentuando os benefícios que uma caminhada traz ao organismo e à inquietação da abstinência. Senti que o devia acompanhar mas estava tão entretida no computador a tentar retocar o malfadado logótipo do Mulherio (queremos tirar-lhe aquele fundo preto mas não está fácil) que abdiquei da solidariedade devida ao meu companheiro e deixei-o sozinho entregue aos seus dramas.
Passou-se uma hora. Conhecendo-lhe os hábitos comecei a estranhar tamanha ausência. O telemóvel ficou em casa, porém não encontrei as chaves do carro. Tal facto levou-me a deduzir que tinha ido espairecer longe. Passaram-se duas horas. Agora comecei a ficar preocupada. Onze e meia da noite e o meu Juvenal sem aparecer, ele que não é dado a hábitos nocturnos nem a socializações after-eight. Comecei a telefonar aos amigos mais chegados e, por via da minha preocupação, a pôr toda a gente em alvoroço.
Já me prestava a sair porta fora no seu encalço quando, vindo do quarto, me aparece estremunhado na penumbra do corredor. Fiquei desconcertada. Olha-me este! Tanto discurso e foi espetar o cu na cama, sem pejo nem aviso. Trovejaram raios e coriscos. Pu-lo ao telefone, a debitar desculpas e justificações aos amigos. Depois serenei. Não fazes ginástica de uma maneira fazes de outra. Tenho uma terapia especializada para as tuas maleitas. Volta para a cama que eu já lá vou ter.
Ele há males que vêm por bem.

Boas Bicadas

5 comentários:

Catharina disse...

Digo que preciso de me viver na 1ª pessoa,porque todas aquelas pessoas que fazem parte da minha vida,constituem esta 1ª pessoa =)

Obrigada !

Achadiça disse...

Catharina não precisas de agradecer. Eu é que tenho muito gosto em partilhar os nossos textos e de vez em quando "dar-te uma bicadita"...
Boas minhocas

Achadiça disse...

Achadiça
Pôe-me esse gajo a correr e deixa-te de contemplações... e ele que não se atreva a vir para aqui esgravatar. PERCEBES????
Boas minhocas (com pouca gordura, se possível)

PortugaSuave disse...

Bom método. Muito bom método.
Cumprimentos e não exagere no tratamento :D

Achadiça disse...

Cris
a correr e a saltar... e as meninas a aprender (lembras-te?)
Não te preocupes que o "mano" prometeu.

Portuga
Também gosto do seu. Aquele do "Há dias assim", talvez para outras terapias, mas por certo agradável (o método).