sábado, maio 20, 2006

Rosa Púrpura

Encontrei a Rosa num bar, numa noite de sábado. Daquelas em que podemos entrar noite dentro sem a preocupação do dia seguinte. Rosa Púrpura. Rosa de nome, púrpura de estado de alma, dou-me a quem quero, como quero. De verdade dou-me apenas nos beijos que dou noutras bocas, como ela diz, em jeito de auto-retrato.
Atrevidamente apetitosa aos olhares sórdidos dos homens, espartilhava volumes em escassa indumentária, no abandono solitário do balcão. Insinuava, entre goles de vodka e cigarros acabados, olhares de quem está ali para se mortificar à volúpia dos sentidos e dos amores efémeros da noite. Despudorada.
Não era bonita, mas tinha a postura fácil de quem quer agradar e não recusa ser agradada. A maquilhagem escondia traços desfavoráveis e conferia-lhe brilhos apetitosos. E ela sabia disso e queria que fosse assim.
Olhou-me fixamente como quem nada teme. Não sorriu, não compôs o cabelo, não trejeitou maneios. Fixou intencionalmente os seus nos meus olhos, levou o copo de vodka aos lábios, pousou-o delicadamente, levantou-se e dirigiu-se à porta, sempre com os seus olhos enterrados nos meus, evidenciando a premência do convite. Saiu serena e perfumada, despertando olhares diagonais. Fiquei petrificada.
Ela não sabia que eu sabia. Ela desconhecia que eu a conhecia. Ignorava que eu detinha, discreta, o fascínio dos seus segredos e fantasias. Ou talvez não. Com a Rosa nunca se sabe!

Nota da autora: A Rosa Púrpura morreu a 30Jun2005. Quem quiser visitar a sua campa deve possuir um espírito aberto e fazê-lo solitária e recatadamente. Contém inscrições eventualmente chocantes.
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8 comentários:

Achadiça disse...

cris olha que a rosa é fogo. foste atrás dela :P? eu gostei, especialmente porque por trás da brejeirice há uma malícia sedutora e uma sensibilidade poética fascinante. no outro galinheiro, o da rosa guerreira, essa abordagem é mais notória

B:»~~ como diz a nossa querida donadaprima

PortugaSuave disse...

Literário? Fascinante? Poesia? Não me diga que o género é poesia pós-pós-moderna. Daquilo estão os escaparates da América do Norte repletos, em saldos de fim de estação.
A miúda só porque escreve umas larachas depravadas ao sabor de insatisfações clitórianas já convence. Achadissa e Cristalinda o que é que se passa com as meninas que até escrevem bem. Tal facto devia conferir-vos um juízo crítico mais apurado. Está-me a escapar alguma coisa!

Achadiça disse...

Portuga
hesitei em responder ao seu comentário, primeiro porque me soou a provocação gratuita, depois porque não adianta descrever um arco-íris a um daltónico; terceiro porque a sensibilidade é um dom de que, manifestamente, o amigo não é dotado; quarto porque confunde pérolas com bolotas; quinto porque de satisfações "clitorianas" o querido não percebe nada a avaliar pela maneira como escreve "clitórianas"; sexto porque não me parece que a Gronelândia tenha os escaparates cheios de escritos tipo rosa; sétimo...céu, que dificilmente vai ganhar se insistir nesses pudores de puritano moral duvidoso zz; mas como nos faz falta por cá o tal diácono e todas as opiniões são bem vindas, mesmo que discorde delas, aqui fica o meu comentário.

como o considero perspicaz e já o entrevi jocoso, decerto não me interpretará mal.
ainda assim insisto para que leia a rosa soft, a guerreira. acredito que reformulará a sua análise precipitada. deixo-lhe um exemplo

B:»

PortugaSuave disse...

Achadiça
Não precisava ficar amofinada. Estará a advogar em causa própria???? Não me parece. Então para quê esganiçar-se! Será sua amiga, daquelas de cofiar as penas na mesma banheira!
Nem ofensiva. Mas isso agrada-me. Revela humanidade. No meio de tanta galinha é de louvar.
Pronto, dois ou três textos são bons, alguns razoáveis, a maioria sofrível. É a minha opinião e vale tanto quanto a sua.
Cumprimentos

Achadiça disse...

donadaprima
debaixo não, mas já me imaginei neles...

Achadiça disse...

Desculpem não ter alinhado umas palavras para comentar a vossa controvérsia mas andei ocupada com questões académicas que me levaram o tempo todo. Aliás, a propósito dessas questões estava a pensar escrever no Mulherio algumas transcrições desse trabalho, mas estou bastante hesitante. Os temas são complexos e não me parece enquadrarem-se no espírito do blogue. A saber: A estética pós-moderna; O Absurdo Negro da Morte ou Os Deuses Nunca Morrem, considerações sobre A Aparição, de Virgílio Ferreira. O que achas Achadiça? Vou enviar-tos por mail e logo verás.

Portuga
Quanto à Rosa, ela é mesmo assim, bela e monstruosa, genuína e disfarçada, suave e espinhosa, delicada e tenebrosa, egoísta e generosa, difícil de tão fácil. Goste-se ou não, os textos transmitem desnudadamente os extremos emocionais do universo feminino. Fotografias íntimas.

Donadaprima
Com ou sem saltos, gostou da Rosa?

Boas minhocas

Achadiça disse...

ó cris quem é que ia ler estas coisas aqui no mulherio? tás-te a passar ou foram efeitos da intelectualidade lisboeta... aliás tu própria reconheces a crise dos valores estéticos e o hedonismo em moda. Prazeres imediatos é o que a malta quer, estéticos ou não, especialmente aqui a galinhagem.mas gostei. Como sabes temos só três comentadores por aqui, o cingab, o portuga, que depois do meu comentário não sei se por aqui volta a bicar e a dona dona...se eles manifestarem alguma curiosidade ok, pespegamos-lhes com os teus tratados.

B:»

PortugaSuave disse...

Por mim venham lá os tratados...doentes é que não, ehehehe