terça-feira, abril 24, 2007

Evocativo



A data de 25 de Abril de 1974 traz-me à memória deslumbramentos de tenra idade. Por essa altura tive uma paixão platónica pelo professor de Ciências Sociais. Recordo-lhe as guedelhas de intelectual, que talvez não fosse, as calças de ganga justas e as sapatilhas brancas. Não teria mais que 26, 27 anos. Para mim as palavras capitalismo ou proletariado, pronunciadas pela boca dele, eram autênticas e apaixonantes palavras de amor.
Era da nova geração, urbano, “pra frentex”, como se diria agora, e não faço ideia como foi cair na Escola Técnica do Dão. Perante a desorganização pedagógica instalada e o novo ideário político que a revolução semeara, o prof. não se deixava apoquentar. Ao contrário dos professores mais antigos, angustiados com o “poder popular” dos alunos que, a cada reunião académica, queimavam simbolicamente todo e qualquer tipo de poder instituído, em fogueiras ateadas com palavras como reaccionário, fascista ou ditador, o meu prof. de Ciências Sociais movimentava-se descontraidamente naquele clima de excessos. Transmitia serenidade e cativava os alunos mais alvoroçados pelo calor da revolução com o seu método moderno (à altura) de lidar connosco. Tratava-nos por “tu”, ouvia-nos atentamente e respeitava as nossas opiniões, deliberava democraticamente após consultar a opinião geral, organizava actividades extracurriculares ligadas à arte e ao desporto, deixava-nos escolher temas que depois debatíamos na aula, incentivava-nos a defender os nossos pontos de vista, falava abertamente de sexo, de Deus, das religiões, do Homem, mas acima de tudo ensinava-nos a democracia e a vivê-la no respeito pelos outros.
E eu, completamente absorvida pelo homem e pelo professor, não conseguia arrumar um pensamento de cada vez que ele me dirigia a palavra. Sentia-me vítrea, no limite do pudor, receosa que ele detectasse o desejo indisfarçável. Ainda hoje me questiono se alguma vez percebeu que era ele que eu aconchegava nas minhas transgressões sexuais de adolescente despontada. Tenho quase a certeza que sim.
Um dia, data inesquecível, uma aragem vinda da serra invadiu a sala de aulas. Estão a ver as arcadas do edifício principal da escola? Era uma dessas salas, cujas janelas davam para o campo onde praticávamos ginástica, contíguo à antiga casa do pessoal da CPFE. A janela que estava próxima da minha carteira era a responsável pelo sopro de vento que se fazia sentir. Tentei-a fechar mas em vão. O ferrolho não funcionava. Diligente, o professor veio em meu auxílio, mas para chegar à janela teve que debruçar-se todo sobre mim. Ali ficámos durante segundos naquela posição embaraçosa, ele em equilíbrio periclitante, a esforçar-se para trancar a janela e eu, deliciosamente paralisada pelo conforto do toque do seu corpo, tentando controlar o desmaio eminente.
Não ousei mexer-me. O professor persistia com o ferrolho, até que este cedeu repentinamente, entalando-lhe um dedo. Não controlou a dor e deixou sair baixinho, de forma ininteligível para os restantes alunos, mas não para mim, um inconveniente “daaa-se”. Olhou-me íntimo, buscando na cumplicidade do nosso olhar a minha compreensão pelo descuido. E eu percebi naquele preciso momento que tinha acabado de partilhar o olhar dos amantes que nunca seríamos mas que, por breves momentos logrei entrever.
É por isto que o dia 25 de Abril me faz sempre lembrar o meu professor de Ciências Sociais e os meus verdes anos passados na extinta Escola Técnica do Dão.

Boas minhocas

4 comentários:

Cingab disse...

lol

Cingab disse...

Gostaria que fossem vocês a fazer a história das Éguas do Obelisco Vaginium, respeitando apenas isto:
“Riça, Acha e Crista – Têm uma força combinada de 99, poderosas Éguas que respondem ao Obelisco Vaginium... Belas, sinceras, equilibradas da IPF. Têm o poder de recuperar os cavalos feridos em batalhas. Diz-se serem capazes até de ressuscitar cavalos mortos em batalha*”

A Grande Aventura

Achadiça disse...

Agora fomos promovidas a éguas! As galinhas perderam as asas e ganharam cascos! Isso pode ser perigoso... dar às asas ainda nos vai sendo permitido agora se começamos a escoicinhar quem é que nos monta a garupa? Quem é que nos afaga os flancos? Quem é que nos escova o pêlo? Mas está bem, a gente concede, mas com uma condição, a de sermos éguas aladas, sem o reflexo do pinote. Elegantes e intocáveis.
Quanto a ressuscitar... a gente bem tenta, mas os cavalos andam de tal forma moribundos que não há égua que os recupere... bem talvez uma que eu cá sei... a garanhona do gado asinino. Mas cuidado, que essa parece, mas não é domesticável. Adormece-nos no torpor do trote para mais facilmente nos espezinhar no descuido do embalo.
Obelisco Vaginium! Onde ficará isso?
Quanto ao desafio, vamos ver se a Riça lhe pega...
Boas bicadas

Cingab disse...

Basta ir ao
aordemdorelincho.blogspot.com e entendá a questão...
è uam pequena aventura que eu quero escrever... com a ajuda de todos