quinta-feira, outubro 04, 2007

Alfa Pendular. Sábado à noite.


Espero que não venhas tão cedo.
Poderia dizer-te terríveis pequenas coisas com este título, mas não me apetece usar palavras que nos esguicham na boca como amargas malaguetas. A menos que o picante ande a fazer falta e queiramos levar o sabor e o tempo para outras melodias.
Já te vi chegar de muitas maneiras, algumas maravilhosas, outras nem por isso. Esperei-te de todas, desde aceitar-te com alegria e sem condições até ser só alívio e indiferença.
De repente damo-nos conta e criámos dois universos paralelos que coabitam o mesmo espaço e se tornam cada vez mais taciturnos. Palavras, só as essenciais, só aquelas que servem para matar as outras, como a malagueta para abafar o mau sabor do guisado, ou então as que desviam a conversa para assuntos insignificantes, onde as palavras esvoaçam como borboletas de papel enlouquecidas no fumo dos nossos cigarros.
Estamos entrincheirados em queixas insignificantes ditas aos berros, outras, maiores e caladas no ruído da ausência. Atolados de culpa, rebeldia e outras trapalhadas, esgueiramo-nos para dentro de nós próprios até que se torna um vício. Manietamos os nossos impulsos como se tivéssemos medo um do outro e fechamo-nos em frágeis esferas de vidro que não podem tocar-se. Tornamo-nos cada vez mais pequenos e por isso mais afastados, apesar do espaço continuar a ser o mesmo.
É claro que o caminho podia ser enchido com descrições mesquinhas e outras reivindicações cujas palavras de tão gastas são ridículas e por isso só servem para pôr em prática, não para serem ditas.
Também já te vi sair de muitas maneiras, aprumado e bonito, desfeito e vacilante, decadente, zangado ou a dormir, familiar ou um completo estranho.
Hoje, sábado, eu estaria descansada e disponível para sair mas tu já estavas em rota de colisão. Sabia que hoje estarias todo rebentado e não irias sair comigo.
Aperaltaste-te e disseste ‘vou sair’. Eu limpei a cara ao avental. Não estávamos no mesmo plano. Não foi o meu companheiro que saiu aquela porta.
Estás por tua conta, minha cara, de nada te serve o esforço. Precisas de um pai de família e o que tens é uma família sem pai. Isto não é uma acusação. Sinto-o sem mágoa e com a mesma ternura que sinto pelo rapazola tolo que foste e continuas a ser. Tarefa demasiado gigantesca. Só um grande amor ousaria vencer.
Espero que não venhas tão cedo, digo-o por medo, porque sei que achas que devo dizer-te alguma coisa, mas essas são as palavras tampão que só servem para evitar todas as outras. Não vou pedir-te desculpa e não tenho nenhuma maneira natural de to dizer. Lamento. Somos belos mas demasiado vencidos.

4 comentários:

Anónimo disse...

temos divórcio!?

Cristalinda disse...

Temos é divorciada...

Anónimo disse...

"elegantemente divorciada", diz o perfil

Cristalinda disse...

Mesmo elegantemente divorciados temos que nos gramar por causa dos putos... e de outros legados!!