quarta-feira, agosto 02, 2006

Uma história em três actos - Acto III

Esta semana, a viabilidade daquela relação esmoreceu completamente. Vasco pressentiu-o. Alguém tinha alterado o ritmo cardíaco da Rita e esta, na ingénua honestidade de quem pensa não ter nada a perder, confirmou-lho displicentemente ao telefone. Vasco acendeu o primeiro de vários cigarros de um ano de abstinência. Agora a privação era de amor e o apelo à nicotina incontornável.
- Saturado. Estou saturado… ela que diga de uma vez por todas o que quer para eu seguir a minha vida – confidenciou-me ao telefone, entre a angústia e a impotência de quem não pode nem sabe o que fazer.
Não fosse a singularidade daquele telefonema, eu teria pensado que era mais um desvario clandestino da Rita, facilmente cicatrizável e diluível no próximo desarrufo de namorados. Claro que me ocorreu que o telefonema para além de terapêutico servia interesses informativos. Mas eu nada sabia e ele, hábil, não ousou perguntar. Ficámo-nos pelos desabafos de circunstância. Convencida da gravidade da situação, prometi telefonar-lhe brevemente.
Se eu tivesse menos uns anitos impunha-se de imediato um telefonema à Rita, mas a vida ensina-nos que nestas coisas do amor o melhor é ser espectador. Interventiva, só para colar os cacos no fim da refrega.
Passaram dois dias e telefonei como prometi. Embora receosa, pois não me sentia muito disponível para o longo rosário de queixas que se adivinhava, marquei o número e aguardei. Semicerrei olhos e coração para aguentar o embate e deixei fluir a voz cava do Vasco. Aos poucos descontraí, como por efeito de um relaxante muscular que, neste caso se traduzia na aparente tranquilidade com que Vasco desdramatizava o episódio.
- Olha, tudo bem, amigos como dantes…
Tudo bem! Amigos como dantes! Apeteceu-me mandá-los à merda! Que fossem ser (in)felizes para o raio que os parta, apanhar banhos de sol na encosta do Krakatoa, passar férias no Líbano, inimputáveis de uma figa, desmesurados… mas dei comigo a dizer:
- Óptimo, óptimo. Ainda bem que esclareceram tudo. Fica bem. Dá um beijo à Rita e às meninas.
B~~

1 comentário:

Achadiça disse...

Tens toda a razão cris. ele há casais que passam a vida com amuos. envolvem amigos e familiares... levamo-los a sério, tentamos ajudar, por vezes até corremos o risco de interceder por uma das partes e quando damos conta estão outra vez no "bem bom" e a malta é que fica mal vista. uma vez ajudei uma amiga a sair de casa. passei um fim de semana a carregar a tralha toda feita mula... passada uma semana tivemos que voltar a carregar tudo de volta pois os meninos fizeram as pazes. ficou-me de emenda... mudanças destas nunca mais.
De qualquer maneira beijinhos para todas as martas, matildes, ritas e vascos que povoam as nossas vidas
B:»»